Essa discussão sobre o caráter infantil, ignorante e reacionário que a gente está vendo muito no Brasil agora sobre essa disputa extremamente raivosa de consevadores versus emancipacionistas, ou, em termos grosseiros: direita versus esquerda, me fez assistir de novo o melhor debate que eu já assisti a esse respeito, no seu sentido mais estrito mesmo.
Essa discussão do Marcos Nobre com o Felipe Pondé nada tem a ver com o que a gente vê muito hoje em dia no Brasil, inclusive aqui.
Reafirmando: se trata do melhor debate que eu já vi sobre isso. Com a adição de um mediador magnífico na forma como conseguiu incessantemente não deixar de fora nenhum aspecto fulcral que perpassa esse debate.
Tudo isso num clima incrível de respeito pela lógica do debate e cordialidade.
Pois bem, assistindo de novo o debate me veio à cabeça esses elementos preponderentes que de fato demarcam claramente a diferença entre esquerda e direita.
O primeiro apontado pelo Pondé é a dicotomia: Liberdade X Igualdade.
Pondé irá dizer que a esquerda sempre reprimiu a liberdade com base numa utopia e idealização de uma supremacia da igualdade, baseada numa compreensão de uma natureza humana que nunca existiu e nem existirá.
Por sua vez, Marcos Nobre irá retrucar que não se trata de uma utopia ou idealização de uma natureza humana indeterminada ou inconstante.
Para Marcos Nobre o erro do Pondé é duvidar da possibilidade de discussão desses limites mesmos do pensar e agir humanos.
Resumindo: para Pondé a democracia já alcançou o seu ápice e qualquer problematização dessa questão irá ensejar um regresso, ou até mesmo uma catástrofe. Já para o Marcos não existe nada de evidente a esse respeito, pois por mais que exista uma conformidade nas nossas relações, isso não indica que essa conformidade seja apenas um dado da Natureza.
Pondé irá lembrar da experiência soviética que "corrobora" o que ele defende.
Marcos Nobre irá dizer que a experiência soviética não serve como parâmetro, pois a estrutura do Estado não era porosa, ou não permitia à população o seu engendramento, ou mais propriamente: não era democrática.
Logo a questão volta para o elemento fulcral: quais são, verdadeiramente, os limites e possibilidades da democracia?
E de novo voltamos para a questão da natureza humana.
Para a direita, a natureza humana já esgotou a questão da democracia, e qualquer mudança de perspectiva é temerária.
Essa questão da natureza humana com certeza é a mais importante que existe na Filosofia.
O debate sobre isso é imenso e cheio de complexidades.
Para vocês terem uma idéia sobre essa questão, eu gostaria de falar do movimento mais importante e polêmico que existe na Filosofia: o pós-modernismo.
O Pondé é claramente pós-moderno.
Acontece que o pós-modernismo do Pondé entra em conflito com o pós-modernismo (mais puro, eu diria) de outros filósofos.
Eu explico: como todo pós-moderno Pondé irá tomar de Nietzsche o valor à individualidade, mas não no sentido plenamente nietzcheneano, pois essa individualidade (como em Nietzsche) não se expressa como uma possibilidade criadora, e sim uma possibilidade já consolidada nos termos da nossa atual democracia.
Esse é outro imbróglio sem fim para a Filosofia Política Contemporânea: a individualidade como o elemento irradiador e mais importante do desenvolvimento e superaçào do homem.
Aqui todos os pós-modernos são contra os marxistas (e IMO, até os keynesianos, inclusive).
Marilena Chaui, por exemplo, critica muito essa postura pós-moderna, pois pensa que ela empobreceu a reflexão filosófica no sentido de reduzir as relações humanas apenas como jogos de poder móveis.
Para ela, os pós-modernos reduziram tudo a uma relação, nunca perene e por vezes completamente movediça, de amigos versus inimigos.
Um amigo hoje pode ser inimigo amanhã ... e assim o ser humano vai encontrar a sua superação.
Ela também invoca esse caráter agonístico amigo x inimigo, retomando um autor em voga pelos pós-modernos chamado Carl Schimitt (o grande idéologo do nazismo).
Enfim: eu mesmo nào sou capaz de conseguir trabalhar propriamente essa questão que repito: é a mais complexa e difícil da Filosofia Contemporânea.
IMO o meu Spinoza está mais próximo da Chaui do que do Deleuze.
No entanto eu vejo claramente que Deleuze ou Foucault são grandes pensadores de difícil trato.
A própria Chauí nunca desmereceu esses dois, mas eu acho que ela consegue perceber melhor aonde está propriamente a contribuição deles para o pensamento contemporâneo, mas isso tem marcos de ruptura.
Ah!
Eu gostaria de lembrar também uma coisa que eu já vi aqui muitas vezes, mas tive o time de colocar.
Max Weber escreveu sobre a reforma protestante e o espírito do capitalismo.
Ele colocava de forma aguda como a categoria do trabalho de forma alienada surge no capitalismo.
Quem nào lembra dessa frase: o trabalho dignifica o homem?
Isso é uma alienação.
O foda é você ver que essa alienaçào está muito presente em quase todos as pessoas, inclsive aqui.
Eu já vi mais de uma pessoa aqui quase se vangloriar por não ter tido férias há muito tempo, ou no máximo quinze dias no ano.
Eu quase acredito que para essas pessoas o maior valor do capitalismo é o trabalho como uma virtude que irradia o desenvolvimento do povo.
Ou seja: toda essa maravilha que existe no mundo hoje em dia foi fruto do trabalho, compreendido como um valor absoluto, se sorte que isso nunca deva ser problematizado ou desvalorizado para o bem mesmo de todos nós.
Quem sabe o ser humano seria mais ainda desenvolvido se trabalhássemos mais!
Redução da jornada do trabalho é evidentemente uma catástrofe!
Talvez fosse melhor diminuir os feriados, aumentar a jornada para 48 horas semanais, com trabalho em casa ... e nunca seguir o exemplo dos gregos! hahaha
Ah esqueci, Pondé vai tocar na questao da natureza humana citando os darwinistas.
Aí nem rola discutir nada, a ciencia já descobriu o que é a natureza humana.
Quanta petulancia!
Que objeto de pesquisa simples. ou nao?!