Quando você diz "meditar na insatisfatoriedade inerente em todas as coisas", trata-se de um processo racional? Eu utilizo a razão para encontrar uma verdade? Ou apenas "sento" e contemplo isso (sem me utilizar da razão)?
Existem dois modos de investigação no budismo, o empírico e o por inferência. Em geral o modo de investigação por inferência é considerado inferior, e uma preparação para o modo empírico.
Quando se fala em meditar sobre um assunto, isso significa sentar em posição formal de meditação, isto é, imóvel, e examinar o assunto sob diversos enfoques, especialmente aqueles que possuem um impacto pessoal para você. Dessa forma é uma combinação de um enfoque imaginativo, especulativo, misturado com um enfoque de inferência/racionalidade, e empírico, na medida em que suas experiências presentes e passadas são trazidas como elementos principais desse exame.
Isto é, você pode pegar coisas que naturalmente surgem na sua mente (empírico) e imaginar cenários a partir desses surgimentos (especulativo). Com base nisso, você estabelece raciocínios e conclusões. Com base nas conclusões, você passa, paulatinamente, a não precisar examinar a insatisfatoriedade de algo para efetivamente vivenciar essa insatisfatoriedade imediatamente. Em outras palavras, seu engano, que causa seu apego, vai se enfraquecendo enquando hábito, e você desenvolve sabedoria de reconhecer as coisas tais como elas realmente são, isto é, insatisfatórias.
Então é um modo de exame sistemático que envolve surgimentos espontâneos na mente e especulação, e com base nisso inferência e conhecimento empírico direto. Você pode começar com qualquer coisa, e apenas marca um tempo determinado, digamos 15 min, e nesse período você vai manter a postura e examinar esse tema.
Para cortar o sofrimento, é preciso cortar o desejo. Mas isso não é limitar, de certa maneira, a existência?
Para eliminar a insatisfação é necessário abandonar o hábito de depositar confiança em objetos que só podem produzir insatisfação. Não é necessário abandonar os objetos, apenas a crença ignorante e arbitrária de que são eles que vão nos fazer verdadeira e duradouramente felizes.
O Buda usou, literalmente, as palavras dukkha e trishna, que são mal-traduzidas como sofrimento e desejo. Dukkha é melhor como "insatisfação", mas nem mesmo isso é correto. É uma certa ângustia subjacente a todas as experiências boas e ruins. Essa angústica não está nas coisas boas ou ruins, ou na fonte deles, e sim numa visão equivocada delas, como fonte de felicidade verdadeira. Isto é, expectativa.
Colocamos expectativa em que as coisas boas durem e as coisas más se dissipem. Essa expectativa, trishna, literalmente "sede", é que deve ser eliminada, para eliminar insatisfação, angústia, dukkha. O Buda recomenda que a pessoa realmente analise as coisas em que está depositando confiança, e gerando expectativa, e que perceba, em cada uma delas, uma semente de insatisfação.
Dessa forma a pessoa pode se orientar melhor por aquilo que nunca produz insatisfação, e sim traz felicidade duradoura e verdadeira: o reconhecimento da realidade como ela é, livre dos filtros distorcedores das expectativas e dos medos.
tzal.org: 1. O que é budismo?