Postado originalmente por
RRetired
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sopro
Porra @
RRetired, bela passada de pano
Defendem sim o que eles chamam de regime militar (que nada mais é que malabarismo para não usar a palavra ditadura) e criam uma história que o golpe era necessário, digo,
a tomada do poder pelas forças armadas atendendo ao chamado do povo brasileiro.
Citar os jovens nascidos depois é um fator que reforça, primeiro porque a tendência é sempre a geração seguinte ser mais informada como um todo (mais acesso a informação), segundo porque, veja bem, os horrores cometidos na ditadura não eram publicados nos jornais (really?), não passavam na tv (really?), o rádio não informava nada que não fosse aprovado pelo Governo Militar ditatorial (really?) e quem sequer questionasse alguma coisa parecida com isso e um vizinho ouvisse e achasse ruim, o exército aparecia na sua casa e te levava para prestar "esclarecimentos" sobre o seu comportamento subversivo. Aliás, o depoimento do Paulo Coelho sobre a experiência pessoal dele com esses "esclarecimentos" dá só uma ideia da dimensão de coisas que aconteciam nesse processo. Ou seja, as pessoas que viveram na época ditadura estavam totalmente desconectas da realidade do país, você só conhecia a sua própria realidade e parte do que as pessoas mais próximaste contavam (afinal, quem vai arriscar falar demais e correr o risco de acordar com a boca cheia de formiga?), numa época que nem o telefone era popular. Pense na fragilidade de difundir informação naquela época e de como isso facilitava o controle (quase) total daquilo que era difundido.
Aí a ditadura acaba, uma geração começa a ter acesso ao que acontecia, documentos, testemunhos... alguns que inclusive só foram abertos ao público anos atrás.
Você tem razão quando diz que o que eles tentam fazer é adicionar alguns elementos a mais numa discussão, mas elementos mentirosos, distorcidos e/ou sem fontes/documentos. Que existe uma esquerda retardada e que também distorce vários fatos, claro que sim, agora, os corpos que nunca foram encontrados, pessoas forçadamente exiladas, documentos que comprovam a existência de torturas e homicídios de cunho político, a tentativa bem sucedida de destituir um presidente eleito democraticamente e por aí vai, isso não é discurso de A ou B, são fatos. Ocorreram, possuem nome, sobrenome, documento.
Eu não acho que seja muito bom que surjam conteúdos que pagam de documentário, de informativo e possuem tanto cuidado com a realidade quanto as reportagens do Domingo Legal sobre o chupa-cabras.
Aliás, usar a palavra documentário é de certa forma equivocada, essencialmente um documentário é um filme relato baseado em documentos (ou testemunhos de 1º grau) com a pretensão de mostrar uma faceta verdadeira (não necessariamente única) sobre determinado acontecimento ou pessoa. Quando é só um monte de gente dizendo que fulano disse que o primo disse que o vizinho viu, "documentos" sem fontes para verificação, montagem de imagem (a foto da Serra Pelada editada para parecer como guerrilheiros comunistas) e tudo mais, o termo mais correto talvez seja mockumentary, uma linguagem audiovisual que simula a linguagem documentarista, mas apresenta uma ficção.
Cara, você assistiu o filme?
Já que você não quer chamar de documentário, vamos chamar de filme. Só vamos ligar pro Netflix e avisar que 90% do conteúdo que eles classificam como documentário está na categoria errada.
Como eu falei, fica claro que os autores do filme tem um lado definido. Os caras tentam forçar a barra em vários momentos como quando dizem que o golpe teve apoio de toda a sociedade civil ou quando mostram o avanço comunista no Brasil como uma coisa que iria de fato acontecer caso não fosse a intervenção militar. Mas apesar deles citarem o golpe como algo necessário em um primeiro momento, os caras não defendem nada do que foi feito pós AI-2, pelo contrário, o filme e os entrevistados fazem criticas ao que aconteceu depois da linha dura do exército assumir o poder. O filme se posiciona contra o fechamento do congresso, censura, perda de direitos, assassinatos e tortura e não a favor como tem gente querendo pintar. Por isso, a discussão em cima desse filme não deve ser em cima disso, e sim em cima de alguns outros pontos como:
1 - O quão real era a possibilidade do avanço comunista no Brasil?
O filme mostra uma visão na qual o avanço comunista era quase certo, coisa que eu não concordo mesmo depois de assistir. Mas de qualquer forma, essa não é e nunca será uma questão fechada, portanto, existe sim a possibilidade de discutir o assunto. Pra tentar provar o ponto de vista deles, os autores usam imagens de movimentos pró comunismo no Brasil, manchetes de jornais da época, entrevistas de pessoas que viveram o período e citam documentos da STB que um cara lá aparentemente encontrou e traduziu, eles chegam a mostrar partes dessa tradução, mas nada conclusivo.
2 - Havendo ameaça comunista real, era necessário um golpe militar? E havendo golpe militar, era necessário ficar 21 anos do poder?
Como eu falei, o filme claramente apoia o primeiro momento do golpe militar, tentando justificar com o povo nas ruas pedindo intervenção e com a ameaça comunista, mas eles não apoiam o fato dos militares terem continuado no poder por 21 anos fechando congresso, cassando direitos, matando e torturando. Na minha opinião, não era necessário o golpe e muito menos ficar 21 anos no poder.
3 - Os grupos organizados pela esquerda brasileira estavam lutando por democracia? Foram eles os heróis que nos libertaram da ditadura?
Eu não tenho dúvida de que tinha muita gente lutando pela democracia, mas na minha opinião esse pessoal da esquerda que tomou conta da política pós ditadura não se incluem nesse grupo, e o filme mostra isso caracterizando Dilma, Genuíno, Dirceu como guerrilheiros terroristas que queriam tomar o poder na marra, mostra também aqueles depoimentos já famosos do Eduardo Jorge, Vera Magalhães e Fernando Gabeira afirmando que eles lutavam pela ditadura do proletariado. Enfim, é mais um ponto discutível.
4 - A ditadura foi dura? Com quem? Ela foi dura se compararmos com outras ditaduras vigentes da época?
Como eu disse, em geral os mais jovens têm um pavor maior da ditadura do que quem viveu o período. Ditaduras mundo afora mataram e torturaram muito, mas muito mais do que a brasileira. O cidadão comum sofria nas mãos dos militares? Quando eu converso com pessoas que viveram o período, eles me dizem cresceram brincando na rua, na adolescência frequentavam festinhas com álcool, cigarro e drogas, exaltam a disciplina que recebiam nas escolas. Aí você vê a classe artística, a mídia e os professores de história dizendo que foi um período de terror e medo. No mínimo aí existe uma contradição que merece discussão. A minha opinião é de que ninguém deveria ter medo de criticar o próprio governo, é óbvio que os militares exageraram muito nesse ponto, mas não dá pra gente misturar tudo e dizer que foi um período onde todos viviam com medo o tempo inteiro.
5 - O Gramcismo e a escola de Frankfurt realmente influenciaram a cultura brasileira nas últimas décadas?
Aqui é um tema que não me interessa tanto, me parece mais uma teoria da conspiração, mas também é tema que dá pra discutir. Essa contra cultura que se fortaleceu no ocidente nas últimas décadas é um processo 100% natural ou teve influência de grupos que sabiam o que estavam fazendo e usaram jovens como massa de manobra?
Enfim, eu não tô aqui pra defender o posicionamento do filme em si, mesmo pq eu não concordo com boa parte do que eles falam lá, mas que sim, existem lacunas abertas e que podem ser discutidas em relação ao que aconteceu nesse período. Incentivar a discussão com pontos de vistas diferentes eu acho muito bom, agora, sempre tem aqueles que tomam um filme desses como verdade absoluta e se posicionam com base nele, mas aí a culpa não é do filme.