A polarização política chegou à oferta eleitoral
Lulistas e muitas pessoas de esquerda celebram a resiliência eleitoral de Lula, que continua cavalgando, por improvável que pareça, apesar da máquina de triturar imagem dos publicadores de opinião e do aluvião de ódio antipetista na opinião pública e nas redes digitais. Também em júbilo estão os bolsonaristas, que certamente não esperavam que o ódio ao PT, à esquerda e à política pudesse, um dia, levá-los tão longe do ponto de vista eleitoral. Jair Bolsonaro representa a concretização de um sonho sombrio, que nem os anos de chumbo da nossa última ditadura conseguiu realizar: ter um autocrata, autoritário e bruto com reais possibilidades de ganhar uma eleição por meio do voto popular.
Se tudo isso parece uma proeza improvável, para uns e outros, não necessariamente o fato de que os eleitores brasileiros estejam divididos entre Lula e Bolsonaro é uma boa notícia para o país. Antes, é uma péssima notícia. Desde a regularização do ciclo eleitoral democrático, no final dos anos 1980, candidatos de centro direita e da esquerda moderada monopolizaram os votos populares. De forma ainda mais acentuada no período de hegemonia PSDB/PT que durou duas décadas. Com a desestabilização total do sistema, em 2015, por conta do impeachment/golpe, chegamos ao fim de 2017 em um estado tal que o centro político ficou deserto, não apenas na opinião pública, já extremamente polarizada, mas principalmente na oferta eleitoral.
O eleitor de centro, defensor de um liberalismo civilizado ou de uma agenda de esquerda moderada, que tem vencido consecutivamente as eleições presidenciais pelo menos desde 1994, parece ter sumido das sondagens eleitorais. É provável que se tenha deslocado para um dos pólos, ou porque é um desencantado antipolítica e antipetista que agora quer alguém verdadeiro, autêntico e antiesquerdista radical como Bolsonaro, ou porque não engoliu o impeachment paraguaio que sapecaram na presidente eleita, a farra amoral do temerismo e as novas políticas antissociais, não aprovadas em eleições, mas mesmo assim enfiadas goela abaixo de todos. Aumenta a densidade eleitoral dos pólos na mesma medida que o centro se esvazia.
Os bolsonaristas já são radicalizados por definição e a sua pauta é basicamente negativa: não ao PT, não aos políticos, não aos Direitos Humanos, não ao direito de minorias, não, não, não. Os lulistas também se radicalizaram, porque querem uma reparação moral depois das barbaridades de 2015/2016 ou porque se sentem acuados, ameaçados e veem em Lula a única possibilidade de resistência. O próprio Lula não poderia ser mais o candidato de centro, como o foi desde 2002. Ele próprio radicalizou-se, como estratégia de sobrevivência, mesmo porque não há mais ninguém no centro para quem ele pudesse falar. Decidiu não morrer quieto, largado a um canto, tirou a faca da bota e se pintou para a guerra.
Estamos entrando assim em 2018, para uma nova eleição. A polarização alcançou e distorceu também as ofertas eleitorais. Agora, os candidatos 3% e 5% não estão mais nos extremos, como costumava acontecer, mas nas posições menos radicais. Pela primeira vez, o centro é que aparenta estar cheio de anões. Os eleitores estão zangados e estão escolhendo com ódio no coração. O que pode resultar daí, não sei, mas nada de bom se anuncia.