Kalamar sente-se melhor depois de ser curado por Orlando. Ele olha para o pingente de Valkaria no peito do monge/clérigo, olha para seus companheiros e fecha os olhos por uns instantes. A pedra em suas costas começa a brilhar em azul, e Kalamar abre seus olhos e sorri. A pedra volta a ser pedra fria, enquanto ele começa a falar:
"Desculpem-me, amigos, estou muito cansado e irritadiço. Vou contar-lhes um pouco de minha história.
Sim, sou Hennd Kalamar, filho de Haggen, que por anos foi ferreiro, mas recentemente tem se dedicado a cuidar da Catedral. Desde pequeno, disseram que eu estava destinado a ser o sucessor de Ghellen Brighstaff como sumo-sacerdote de Valkaria. Com a morte repentina dele, meu treinamento foi acelerado e, embora não tenha sido oficialmente consagrado, todos me respeitam como sumo-sacerdote de nossa amada deusa.
Aos 9 anos, fui levado por Ghellen à Caverna do Saber em Yuden, onde o Helladarion, objeto que é o sumo-sacerdote de Tanna-Toh, a Deusa da Sabedoria, me revelou a história que estou prestes a revelar para vocês. Talvez alguns saibam de parte da história, mas vou contá-la na íntegra para todos, tenho certeza de que há pontos que até mesmo o mais informado de vocês pode não saber. É uma história longa, então peço que tenham paciência."
Ele pede água a vocês, e Alice senta-se do seu lado e oferece-lhe de seu cantil. Agradecido, ele continua:
"Há incontáveis eras, três deuses de Arton - Valkaria, Tilliann e Kallyadranoch, descobriram uma outra Criação, completamente isolada dos mundos, planos e dimensões do multiverso artoniano. Essa Criação era um lugar árido, desprovido de vida, pois lá o Nada e o Vazio nunca haviam consumado seu amor.
Os Três exploraram essa nova realidade e criaram uma raça para povoá-la, uma raça que se tornaria maior e mais poderosa que seus filhos artonianos. Valkaria imbuiu-os de ambição infinita; Tillian deu-lhes inventividade e desapego a limites morais, e Kallyadranoch presenteou-lhes com o poder. Esses eram os Lefeu.
Nunca revelando-se abertamente a seus novos filhos, os Três viram seu crescimento. Forjaram vinte deuses menores como senhores daquele mundo, para serem um dia superados pelos Lefeu. Aquela raça evoluiu mais rápido que os Três supuseram. Assim que puderam, assassinaram seus deuses falsos.
Tilliann tentou se revelar aos Lefeu. No entanto, vendo pela primeira vez aquilo em que seus novos filhos haviam se tornado, seres de ambição e maldade incontroláveis, enlouqueceu. Os Três fugiram de volta para seus Reinos, mas os outros deuses já haviam descoberto tudo sobre as abominações que haviam criado.
Valkaria, Tillian e Kallyadranoch foram punidos, e o Panteão exterminou totalmente os Lefeu. As duas Criações foram isoladas uma da outra, e os deuses fizeram com que nada restasse daquele episódio. Nem lembrança, pois até a lembrança de um deus tem poder. Hoje, nenhum dos deuses lembra-se da verdade sobre os Lefeu e a Revolta dos Três.
A punição de Kallyadranoch, o mentor e manipulador por trás de tudo, foi a pior. Ele foi condenado a ser esquecido. Seu nome sumiu da mente de todos, inclusive dos deuses, e ele era simplesmente chamado de 'O Terceiro'. Tillian já havia ficado louco, então perdeu seus poderes divinos e passou a perambular pelas ruas de Valkaria, perdido em seus devaneios. Já Valkaria teve a menor das punições. Como ambicionar algo era parte da própria natureza da Deusa, ela não podia perder seus poderes por cumprir sua natureza. Como resultado, foi transformada em estátua como punição, com a condição de que, se algum dia, alguém fosse digno de libertá-la, ela voltaria a reinar, mantendo seus poderes intactos. Ela também foi a única dos Três que manteve sua posição como deusa maior, visto que sua principal criação, a raça humana, era a mais próspera do mundo.
Muito tempo depois, guiados pelo primeiro dos sumo-sacerdotes de Valkaria, os humanos fugidos de Arton-Sul chegaram aos pés da Deusa, construíram lá a maior metrópole do mundo conhecido, que tem seu nome. O interior da estátua de Valkaria existe um labirinto construído pelos vinte deuses, em um semiplano. Os 20 deuses construíram uma parte do labirinto, e ele, que é o maior e mais poderoso labirinto de Arton, deve ser superado para provar que Valkaria tem seguidores dignos. Quando isso acontecer, ela voltará a andar livremente em seu Reino e no Panteão."
Hennd respira fundo, seca lágrima de seus olhos, toma mais um gole d'água e continua falando:
"Imaginem como é ouvir tudo isso ainda pequeno. Pior ainda é ter de guardar esse segredo desde então. É a primeira vez que falo dele para alguém que não Ghellen.
Pouco depois da morte dele, parti de Deheon sozinho, numa viagem de autoconhecimento em busca de minha fé. Diferentemente do passado, em que os poderes dos clérigos e paladinos de Valkaria se limitavam às fronteiras da cidade, eles começaram a se expandir e a existirem mesmo fora dos limites da cidade. Isso indicava que estava chegando a época de libertar a deusa. Descobri em minha jornada que eu seria um dos responsáveis por libertá-la. Para isso, eu deveria resgatar a Lágrima de Valkaria, essa pedra sagrada que está atrás de mim, que contém a única lágrima derramada por ela em seu momento de condenação.
Apesar das enormes dificuldades, consegui resgatar o artefato, mas ao final de minha missão, estava ferido, cansado e quase inconsciente. Infelizmente, não sabia que estava sendo vigiado por sszzaazitas. Eles se aproveitaram de meu momento de fraqueza para me capturar, pois queriam entregar-me como sacrifício, a Sszzaas.
Um grupo de aventureiros me resgatou, mas descobri que eles eram quase tão maus quanto os sszzaazitas, focados apenas nos ganhos financeiros, e queriam me entregar de volta aos cultitas do Deus da Intriga quando descobriram que eu não carregava muito dinheiro comigo.
Orando à Lágrima, fui transportado para esta câmara, onde estive adormecido desde então, até vocês aparecerem. A Lágrima reagiu a vocês, então vocês devem ser os aventureiros destinados a tentar libertá-la."
Ele entrega a Lágrima a Orlando, e, nesse exato instante, ela se torna um pingente azul. Orlando coloca o pingente na corrente em que carrega o brasão de Valkaria, e sente a enorme força de sua deusa emanada dele.
"Tenho de dar um jeito de voltar a Valkaria, pois preciso preparar a estátua para recebê-los. Se estiverem em alguma missão, continuem-na e vão até o fim, já que tudo pode ser importante para o desenvolvimento de vocês. Quando estiverem em Valkaria de novo, procurem-me na Catedral. Se eu não estiver por lá, meu pai terá todas as instruções a vocês."
Alice, nesse momento, se interpõe e fala:
"Não precisa se preocupar em voltar. Eu posso te levar para lá através de magia."
E então, voltando-se para os companheiros de grupo, diz:
"Vou cuidar dele e levá-lo de volta a Valkaria. De lá, acho que voltarei ao meu lar. Aprendi muito com vocês, mas acho que chegou a hora de encarar os fatos e entender que não sou tão forte como vocês. Minha colaboração com Valkaria será levar seu sumo-sacerdote de volta para ela são e salvo. Não posso fazer mais que isso, e seria um peso em seu caminho. Boa sorte em sua jornada. Se um dia nos encontrarmos de novo, terei muito prazer em vê-los novamente."
Dizendo isso, ela deu a mão a Hennd, e os dois sumiram da sala.